sábado, 24 de outubro de 2009

Estratégia de gestão: Bogari Value propõe investimento em empresas, não em ações

Segue a dica:

SÃO PAULO - Perseguindo a meta de bater o Ibovespa em prazo de três a cinco anos, o fundo de ações Bogari Value vêm continuamente superando a rentabilidade do principal índice da bolsa brasileira. Existente desde 2006 como um clube de investimentos, e transformado em fundo em julho de 2008, Flávio Sznadjer, sócio gestor do fundo, aponta que desde sua fundação, há três anos, a cota saltou de R$ 100 para R$ 656. "Mesmo com a crise do ano passado, e as surpresas desse ano, conseguimos uma rentabilidade superior ao índice", afirma o gestor.Em entrevista à Infomoney, Sznadjer explica o funcionamento do fundo de ações long-only, que ele descreve como "o fundo mais careta em termos de fundos de ações", que se baseia em análise fundamentalista, e afirma que a ação, muitas vezes, é quase somente um detalhe a se observar, além de traçar as próximas apostas do fundo.InfoMoney - Como funciona a estratégia do Bogari?Flávio Sznadjer - Nossa estratégia é equivalente ao mercado de private equity, que é o mercado de onde eu vim. A ideia é comprar boas empresas, e mantê-las na carteira de três a cinco anos, até que elas se maturem e, consequentemente, o preço dos ativos seja refletido no valor de mercado. Acredito que a grande diferença entre a estratégia do Bogari e dos outros fundos é que além de fundamentalistas, estamos menos preocupados com a popularidade dos ativos, ou o tamanho da empresa. Além de observarmos se os papéis são bons e baratos, olhamos a previsibilidade de fluxo de caixa e a perspectiva de crescimento. É importante que a gente consiga entender o negócio, entender quais são os drivers de crescimento.A nossa vivência de todos os lados da mesa nesse mercado - como controlador de empresa, sócio minoritário, gestor, consultor - também nos dá a vantagem de conhecer melhor a dinâmica, o que é um diferencial relevante, pois entendemos melhor o funcionamento e a cabeça dos controladores, por exemplo.Nosso projeto é de longo prazo, não queremos crescer muito rápido - nossa preocupação não é tanta com o volume administrado. Queremos clientes que entendem essa filosofia.Qual o perfil dos clientes?Quase 90% dos nossos cotistas são pessoa física, e a cota mínima é de R$ 30 mil. Nossa estratégia é adequada para pessoas que têm disponibilidade de investimento de longo prazo, entre 3 e 5 anos no mínimo - que são os prazos em que acreditamos que a probabilidade de se ganhar dinheiro é maior. Eu costumo dizer que é equivalente a uma previdência - é uma parcela dos seus investimentos que você vai esquecer - porque o lucro vem com a regularidade e com a composição do capital.
''Há mais coisas a olhar além do comportamento da ação - ela não é um detalhe, mas é quase''Para um período mais curto, é arriscado. Se o investidor planeja comprar alguma coisa com aquele dinheiro - por exemplo, um apartamento - em um ano, talvez não seja o investimento mais recomendado. O mesmo é válido para o investidor que quer aplicar todo o dinheiro que tem, porque ele pode precisar desse dinheiro. Nesse caso, o conselho é aplicar em outros fundos, ou juntar mais dinheiro, e voltamos a conversar quando a aplicação for somente uma parcela do total de capital que o investidor tem disponível.Também é importante mencionar que estamos plenamente alinhados com nosso cliente - até mesmo porque a maior parte do capital é dos sócios, então, se o fundo não der dinheiro, estaremos entre os maiores prejudicados. Dessa forma, o cliente deve ter um horizonte de longo prazo, paciência e que entenda o que é investir numa empresa, e queira que quem toque os investimentos dele seja comprometido e que tenha esse tipo de experiência.O que quer dizer "investir em uma empresa, e não em uma ação"?A ação pode ser encarada como um meio ou como um fim para se ganhar dinheiro. Para quem veio de private equity, a ação é um pedaço de uma empresa. No longo prazo, o preço que a empresa é negociada converge para o valor intrínseco dela. Ela vai valorizando porque o lucro dela aumenta, e a ação tende a acompanhar esse negócio ao longo do tempo - é nesse sentido que nós investimos nas empresas. Nosso foco é a empresa, e não a ação - a ação é consequência de uma análise bem feita da empresa. Há mais coisas a se olhar além do comportamento da ação - ela não é um detalhe, mas é quase.Então a volatilidade dos ativos não é a maior preocupação?Existem estratégias que operam com volatilidade - aí você está usando a bolsa como um fim, não como meio para se comprar uma empresa. Para nós, a volatilidade não é relevante, e não é uma medida de risco razoável pro que a gente faz. Risco, do nosso ponto de vista, é o modelo de negócios da empresa, se ele é estável ou não, se ele vai se perpetuar ou não. Se existir a chance de a empresa acabar daqui a três anos, pra mim é risco. Se ela oscilar muito, mas continuar gerando caixa, é menos relevante - é, na verdade, mais uma oportunidade de vender ou comprar a preços adequados.Um investidor consegue fazer essa análise sem a ajuda de um fundo?Sim, consegue, mas isso exige dedicação. O problema é que as pessoas confundem a facilidade de investir com a facilidade de comprar uma ação. Comprar uma ação é fácil, mas ganhar dinheiro com ela, nem tanto - tanto que, com a crise, as pessoas acabaram se arrebentando, porque não tinham técnicas, disciplina, sangue frio. Um investidor vê que a bolsa caiu 40% e vende tudo - o que é exatamente o que ele não pode fazer. Por isso, às vezes, é preciso ver que não se tem essas características - ou mesmo tempo para se dedicar a isso. Mesmo nossos clientes, a maioria é formada por grandes empresários e executivos, que sabem fazer, têm a técnica, mas não têm tempo. Aí é melhor dar o dinheiro para alguém investir para você.De qualquer modo, acho que é possível uma pessoa física ganhar dinheiro com isso - eu mesmo comecei em outro mercado de investimento - mas tem que ter muita disciplina e muito estudo. Não dá pra gastar pouco tempo com isso, é preciso acumular conhecimento da dinâmica de mercado. E poucas pessoas têm a disciplina e o conhecimento técnico necessário.Qual é a importância, para quem investe, de se conhecer a empresa antes de investir?Acho que, nesse ponto, temos uma visão um pouco diferente de um gestor que veio do mercado financeiro. Como já conhecemos o lado da empresa, sabemos as complexidades de implementar uma mudança em uma companhia - o ritmo das empresas é muito diferente do tempo da bolsa, e requer mais paciência. Nada relevante que está sendo feito em uma companhia vai aparecer no balanço no mesmo ano - isso é muito raro, geralmente os impactos positivos só vêm em seis meses, 1 ano. Essa paciência que nós temos parece uma coisa simples, mas é fundamental.
''As pessoas confundem a facilidade de investir com a facilidade de comprar uma ação''Vocês fizeram alguma adaptação à estratégia do fundo no período de crise?Não teve nenhum grande ajuste de estratégia na crise, o que nós fizemos foi uma reavaliação do nosso portfólio, e uma realocação de capital, mas baseada nos mesmos princípios. Tínhamos alguns ativos em carteira que estavam baratos, mas havia outros mais baratos, que tinham caído mais. Então, vendemos coisas baratas para comprar coisas tão baratas quanto, com maior qualidade, ou ainda mais baratas, mantendo a qualidade.E como foi o desempenho durante essa época?A nossa filosofia mostrou que faz sentido já que, em 12 meses, abrimos um gap grande entre nosso fundo e o Ibovespa, especialmente devido a essa re-arrumação do portfólio. Em 2008, caímos 20% - mostrando que nossa estratégia foi aderente - caímos menos do que o Ibovespa (que recuou em torno de 40%). Isso acontece por diversos motivos: não temos commodities (que tem menos previsibilidade), temos uma margem de segurança maior, os nossos ativos eram mais baratos e acabaram caindo menos - o que ajudou nessa retomada este ano. Esse ano, estamos subindo 82,7% (até 7 de setembro), enquanto o Ibovespa está subindo pouco mais de 50%.Como são escolhidas as ações?Nossa ideia é olhar a empresa por dentro - entender quem é o management, como eles veem o negócio, como eles querem fazer - e ver se o modelo de negócios que eles estão falando, a história deles, fica de pé ou não. Esse é nosso primeiro screening.O segundo screening é o preço. Aí não importa muito se ela faz parte do índice ou não - onde ela está é menos relevante do que as características da ação. É necessário que os papéis tenham um nível mínimo de liquidez, e o lote de compra vai ser ajustado a um nível de liquidez adequado pro fundo - se o ativo tem mais liquidez, posso comprar mais, porque há menos problema de saída. E a ideia é sempre comprar um preço bom.Normalmente, são empresas que não estão "na moda". Empresas para as quais o mercado olha menos, que são menos cobertas pelos analistas, que, geralmente, não estão no índice.Essas empresas menores, menos acompanhadas, são, inclusive, uma oportunidade para a pessoa física que quer investir e se dedicar. Além de elas muitas vezes serem mais baratas, é muito mais difícil ganhar dinheiro relevante com uma empresa que todo mundo conheça, uma empresa do índice [Bovespa], do que com uma empresa que menos gente conheça. Como tem muito menos gente olhando, é mais fácil ganhar dinheiro. Mas isso não é para qualquer um - as pessoas têm que conhecer os seus limites para saber o que pode fazer ou não.Quais as apostas do Bogari agora?Nossa aposta é no mercado interno, não tem como não ser. Acho que o Brasil está passando por uma situação de melhoria consistência, de convergência para desenvolvimento no médio prazo - e, no momento, não há como acreditar mais no mercado externo do que no interno, que a gente conhece bem. Eu não consigo, com uma certeza razoável, entender o que vai acontecer com as exportações, com o dólar, com as empresas de commodities.Minhas maiores apostas estão no mercado imobiliário, que é claro que ainda tem bastante potencial de crescimento nos próximos anos; o mercado educacional, que também deve ver bom avanço nos próximos anos; e o varejo, que também tem boas perspectivas.